sábado, 28 de novembro de 2015

EU VEJO GENTE DOIDA

Crítica de  A VISITA, publicada na Folha da Manhã em 28/11/15




Quando no ano de 1999 foi lançado O Sexto Sentido o seu diretor, M. Night Shyamalan, então com apenas 28 anos, foi considerado uma das promessas mais talentosas de Hollywood. Havia motivos para o entusiasmo. O Sexto Sentido tinha um roteiro intrigante (do próprio Shyamalan) que precisava de uma direção acurada e meticulosa para não estragar a surpresa final, e o jovem indiano a tinha superado o desafio com sucesso.

Os filmes imediatamente posteriores que Shyamalan fez (Corpo Fechado, Sinais, A Vila) mantiveram essa proposta de narrar uma história cuja premissa era disparatada, mas que se tornava verossímil devido à habilidade que o diretor tinha para criar a estrutura narrativa que pudesse sustentar o peso da loucura que apresentava. Lembremos Corpo Fechado, por exemplo: um segurança depressivo se revelava um herói invencível que não podia ser ferido nem morto, mas ele nunca tinha reparado disso até se encontrar com seu oposto, um arqui-inimigo frágil e doente. Parece loucura, é era, mas uma loucura bem bolada.

Entretanto, a cada novo filme, a premissa ia se tornando cada vez mais absurda, e a tolerância do espectador chegou a um limite a partir de A Dama D’Água, pois depois desse filme a os delírios fantásticos e a pretensão apresentada não eram acompanhados da antiga habilidade do diretor em narrar histórias convincentes.

A Visita, o ultimo trabalho de Shyamalan, deve ser celebrado, pois se trata de um retorno ao estilo de seus primeiros longas. Um pequeno conto de terror que também é de certa forma uma comédia negra. Dois irmãos, uma adolescente que anseia ser documentarista e um garoto com aspirações de ‘rapper’, vão visitar pela primeira vez seus avôs maternos, os quais tinham cortado relações com a mãe dos meninos antes destes nascerem.  A casa dos coroas onde os jovens passarão uma semana fica numa fazenda afastada da cidade, e eles logo perceberão que as costumes de seus parentes são bastante perturbadoras, especialmente a partir das 21:30h, horário em que é melhor não sair do quarto de dormir.

Shyamalan adota o estilo ‘found footage’ para narrar sua fábula, de maneira tal que as únicas imagens que vemos são as produzidas pela câmera da protagonista, que está tentando fazer um documentário sobre a sua família. Esta modalidade, que se revelou muito eficiente para histórias de horror a partir de “A Bruxa de Blair”, produz alguns momentos de inquietação e sobressaltos, mas por vezes parece forçada demais. É um subgênero que começa a mostrar sinais de esgotamento, embora continue tendo um apelo significativo no público adolescente.


Todavia, recomendo não assistir A Visita esperando ver um filme de terror, pois a frustração estará garantida. Se trata, bem mais, de uma sátira de terror. Uma adaptação, muito livre e tenebrosa, do velho conto de João e Maria, aquele onde os dois irmãos se deixavam seduzir por uma anciã e a sua casinha de doces. Shyamalan pega daquela estória a ideia da confrontação entre a inocência da juventude e a perversão da velhice, alertando também à criançada acerca de como podem ser demenciais certos relacionamentos familiares, quando se prefere o orgulho ao amor.  Um defeito que, esperamos, o próprio Shyamalan parece ter corrigido da sua filmografia.

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