segunda-feira, 6 de abril de 2015

INDIFERENTE

Crítica de INSURGENTE, publicada na Folha da Manhã em 03/04/15


Num certo futuro, aquilo que alguma vez foi a cidade de Chicago será dividida em cinco facções: Amizade, Abnegação, Erudição, Franqueza e Audácia. Numa determinada idade, todos os jovens devem escolher a qual facção irão permanecer pelo resto das suas vidas, baseados em testes prévios que pré-determinam a escolha a tomar. Quem não se encaixa completamente num dos grupos, é considerado divergente, e aparentemente são uma ameaça para o sistema todo.


Logicamente, a protagonista de Insurgente, Tris  (Shailene Woodley), é uma divergente. No primeiro filme da franquia, “Divergente”, ela tinha escolhido o grupo de Audácia, e o seu roteiro se dedicava a narrar os ritos de iniciação e treinamento que ela e outros candidatos deviam passar para serem admitidos como integrantes da facção. Entretanto, o seu espírito rebelde a levaria despertar uma revolta contra os planos da facção Erudição, cuja líder Jeanine, interpretada por Kate Winslet, pretende se impor por sobre o resto.


Nesta continuação, Tris está refugiada na facção Amizade, junto com seu namorado e outros ex integrantes de Audácia. Amizade é uma comunidade paz-e-amor que se dedica a atividades agropecuárias, e não quer brigar com ninguém. Tris, como já tinha acontecido na Audácia, não se sente a vontade aqui.  Acha chato.  Mas o aborrecimento será resolvido logo, pois uma força de Audácia invadirá Amizade em busca de divergentes, os quais serão procurados dado que só eles podem decifrar uma mensagem encriptada numa caixa misteriosa, cuja revelação, segundo entende a líder de Erudição, lhe dará o poder absoluto.


Se toda a explicação anterior lhe resultou confusa, não se preocupe, pois isto não tem a menor importância. Esse arcabouço argumental funciona apenas como desculpa para sustentar uma cambada de cenas de ação, recheadas de efeitos visuais impactantes que remetem a filmes como Matrix e A Origem, através de suas alusões a realidades virtuais e combates que só acontecem na cabeça da protagonista.


A franquia  Divergente pertence a um recente subgênero  da ficção científica que poderíamos denominar ‘distopias adolescentes’, similares a outras séries de filmes como são“Os Jogos Vorazes” e “Maze Runner: Correr ou Morrer”.


Em todas elas, os protagonistas são jovens inseridos em sociedades totalitárias pós apocalípticas, que decidem se rebelar contra a estratificação de classes, estabelecidos pelas autoridades, e acabam liderando revoltas tendentes a construir um novo modelo de comunidade. Entretanto, esta historia padrão, que tem suas particularidades em cada série (uma competição perversa em “Jogos Vorazes”; um labirinto a ser percorrido em “The Maze Runner”; etc.) funcionam apenas como uma espécie de cenografia temática numa arena de luta. Não há nenhuma intenção de refletir acerca dos perigos das desviações totalitárias, como o faziam os romances “1984”, “Fahrenheit 451” ou “A Laranja Mecânica”, todos eles adaptados em versões cinematográficas. Nestes, falava-se em verdade de ameaças ao presente, embora fantasiado como futuro.


Nestas novas distopias adolescentes, pareceria que o que se tenta apenas é produzir uma  empatia etária com o público, identificando-o aos protagonistas, que são jovens inconformados com os abusos das regras criadas pelos adultos, isto é, os pais. Mas, como bem apontara Aluysio Barbosa (aqui)na sua crítica sobre o mesmo filme, para rebeldia já tínhamos “Clube dos cinco” de John Hugues.
Todavia, receio que “Insurgente” nem sequer pretenda gerar algum tipo de  identificação com os adolescentes. Desconfio que o seu verdadeiro propósito seja simplesmente fornecer ao espectador de duas horas para que possa comer pipoca, e se esquecer tanto do que se passa fora do cinema quanto dentro dele, fascinando-o com imagens de prédios explodindo em câmera lenta. Insurgente é uma espécie de ‘soma’, aquela droga supostamente inofensiva dessa outra distopia chamada  “Admirável Mundo Novo”.




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